Projeto de monitoramento em sessões clínicas recebe críticas e elogios em audiência pública na Câmara

por Juliana Teixeira de Melo publicado 09/08/2023 13h45, última modificação 09/08/2023 15h26

A Câmara de Timóteo promoveu mais um um importante encontro, na noite desta terça-feira (08),com os vereadores, secretários municipais, representantes dos profissionais da psicologia, odontologia, fisioterapia, terapia ocupacional, médicos, conselho tutelar e algumas mães de crianças com necessidades especiais para que as partes envolvidas pudessem fazer suas ponderações a respeito do PL 4.497, que torna obrigatória a instalação de câmeras de monitoramento em sessões clínicas que atendam pessoas com deficiência. O objetivo dos vereadores foi ouvir mais uma vez as considerações contra e a favor do PL que deve ser inserido na ordem do dia na próxima reunião ordinária.

A matéria, de autoria do vereador Adriano Alvarenga, visa atender pedido de familiares de crianças e adolescentes com deficiência, que relataram agressões físicas durante as sessões. O projeto já foi aprovado em primeira votação, porém teve pedido de vista concedido, na segunda discussão e votação, após manifestação de três vereadores. O Conselho Regional de Psicologia enviou um parecer à Câmara se posicionando contra a matéria. 

Críticas

Durante o encontro, o PL foi alvo de muitas críticas quanto à legalidade, à funcionalidade e à eficácia por diversos motivos elencados pelos representantes de conselhos profissionais. Representando o Conselho Regional de Psicologia, Marleide Marques reiterou a posição contrária ao projeto. “Somos contrários à filmagem tal como está no projeto, pois é uma estratégia inadequada, que abala um preceito fundamental entre profissional e paciente que é o sigilo das sessões e esse sigilo está como um dever e um direito na Constituição Federal. A Lei Geral de Proteção de Dados não garante a privacidade, pois dados são passíveis de serem vazados e isso ficaria perpetuado. Logo esse projeto trará consequências como prejuízo na qualidade dos serviços prestados e desassistência para esses pacientes, pois muitos profissionais deixarão de atender esse perfil”, considerou Marleide.

O representante do Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional, Raphael Giudicelli também se posicionou sobre a matéria do PL 4497. “Já tem lei que garante acompanhante para esses pacientes, então não precisa de uma lei de duplicidade, que gera custos e viola direitos e deveres previstos na Constituição. A causa é justa e ninguém é contra a transparência nesse caso, mas não justifica essa proposta”, disse Giudicelli. A representante do Conselho Regional de Serviço Social, Micheline Sampaio disse que é preciso políticas públicas para esse nicho da população e que o projeto de lei não contempla o que se propõe e fere a ética e o dever do profissional previsto na legislação brasileira.

Além das categorias profissionais da área da Saúde, algumas mães de crianças com necessidades especiais também se posicionaram contra o projeto, alegando que há uma distorção dos pais em relação aos cuidados com os filhos especiais. “A gente tá terceirizando o nosso olhar para nossos filhos, e a imagem pode dar duplo sentido também para uma avaliação, prejudicando bons profissionais e o tratamento dos nossos filhos”, disse uma mãe de criança com microcefalia. Outra mãe também disse ser contra o projeto. “Nós pais é que temos que fazer a leitura dos nossos filhos que não verbalizam. Não coloquemos a responsabilidade que é nossa, nas câmeras, nas clínicas, nos profissionais. Então penso “Não às câmeras”!, porque antes delas vem o meu cuidado como mãe e cuidadora. O projeto é bom, mas devemos ter cuidado”, considerou.

O presidente do Instituto Parkinsoniano e de Doenças Neurológicas e Degenerativas de Minas Gerais, Gervásio Pierre, também se posicionou contra o projeto. “Respeito às mães e seus filhos, nós que temos Parkinson e Alzheimer também somos agredidos e não serão as câmeras que vão impedir. As demandas dos deficientes são outras, não essa. O que vai acontecer é um conjunto de demandas judiciais se esse projeto virar lei”, afirmou Gervásio. 

Motivação

Adriano Alvarenga ressaltou a motivação do projeto. “Um caso pra mim basta para me motivar a entrar com esse projeto. Existe uma lei dessa promulgada pelo presidente da Câmara de Manaus e coisas boas são para a gente copiar. O objetivo desse projeto é que possamos fazer prova caso aconteça uma violência. O profissional consegue fazer prova do seu bom atendimento também. Hoje só temos a palavra de um e a do outro. Estamos falando de exceções graças a Deus, mas que queremos acabar. Afinal, estamos tratando de pessoas em vulnerabilidade que às vezes nem falam”, disse Alvarenga.

O presidente do Conselho Tutelar de Timóteo, Rodolfo Batista ressaltou a legitimidade da motivação do projeto. “Toda lei que foi alterada foi por causa de uma violação de um direito. Leis que são criadas por um fato que aconteceu, como a lei Henry Borel de 2022, para prevenção e enfrentamento de violência doméstica e familiar contra criança e adolescente, que foi criada após a morte do menino Henry que tem como supostos agressores o padrasto e a mãe. Então vamos refletir nisso”, falou o conselheiro.

O relator do projeto, vereador Vinícius Bim disse que o mais importante da audiência é “aprimorar os entendimentos sobre o projeto, como é feito com todas as matérias legislativas que tramitam na Câmara”. O vereador professor Ronaldo alertou para a questão legal do projeto quanto ao que diz na Constituição Federal. “Devemos ter cuidado para que essa lei não seja questionada depois e trazer outros problemas para a cidade”.

O presidente da Câmara, Reygler Max, avaliou a audiência como muito produtiva. “Quando a gente ouve mais, a gente erra menos. Esse encontro foi importante para que no próximo dia 17 possamos apreciar e votar o projeto com mais informações”, considerou o presidente.

Empatia

Bruna Almeida, que tem três filhos autistas, foi representando as mães que relataram casos de vivências de agressões por maus profissionais. Ela pediu empatia para os pacientes alvo do projeto. “Fomos chamados de vitimistas, mas estamos aqui para pedir a validação do nosso posicionamento que não tem nada além do que amor e cuidado. São casos isolados mas que não temos que esperar para acontecer com mais um. Pedimos um pouco de empatia com as crianças que não verbalizam e não conseguem contar fatos passados”, disse Bruna. 

Uma outra mãe presente no plenário, falou sobre o direito dessas crianças terem acompanhante na sessão clínica. Para ela isso não resolve. “Muitas vezes a presença do acompanhante compromete a sessão, a do meu filho quando eu entrei não fluiu. Como faz então?”, alegou. Um pai de uma criança autista alertou outro ponto. “Fala-se que são poucos casos de agressão, mas como podemos mensurar se as crianças não falam? Para essa criança, a imagem será a “voz” dela”, disse.